segunda-feira, 16 de março de 2009

Chapter 15

I

Sangria & Shots


...E tal como te prometi, vou-te escrever uma coisa bonita – à minha maneira – dentro do que o meu estado emocional permite. Não vou falar de amor, porque esse não existe, entre nós. Na verdade não existe um nós, tu foste o meu mais belo ben-u-ron, o meu analgésico, tão rápido a actuar mas de tão rápida duração. Entre conversas tão banais, fiz o que de melhor tinha ao meu alcance, ouvi-te, ri das tuas piadas – mesmo daquelas que não tinham – olhei-te sempre nos olhos, e nem por um minuto deixei de dar atenção ao que dizias. Bebi, rápido e de forma hipócrita os shots e a sangria que gentilmente sugeriste, ouvia aquela música dos cowboys e já tu dizias


« Gosto das tuas calças rotas »


« Sou um rebelde não é? »


E sem entenderes muito bem a ironia, sorrias.


« A sério, gosto mesmo desse estilo de calças »


« Não é bem estilo, é desgaste, não são aquelas calças que já se compram rotas, eu sou oldschool, espero que o tempo se encarregue disso... » Respondi


« Fogo, és paciente. »


« Nem imaginas o quanto, para teres uma ideia, as minhas sapatilhas quando as comprei eram azuis e agora são... sei lá que cor é isto. »


Tu olhavas para as minhas sapatinhas, enquanto eu observava os teus sapatos de saltos, pretos, brilhantes – aposto que cheiravam a novo – ligados a tão belas pernas, brilhantes também, « és o meu oposto », pensei. De brilhante não tinha nada, não naquela noite, estava muito “ não quero saber”, por outro lado tu querias saber de tudo.


« Realmente, já está mais para o cinzento » Respondeste


« É mais isso, cinzento e desgastado, a minha roupa é a minha imagem »


« Não entendi »


« Nada, sou eu a armar-me em vítima, não ligues »


« ohhh, nada de vítima, estás muito bem »


« Estou? Hei pá, chegamos à parte dos elogios? A minha parte favorita...»


« Ai é? Então vá, quero ouvir os teus elogios... »


Ansiosa, olhavas para mim


« hmm... A minha parte favorita no sentido que gosto de ser elogiado, não de elogiar...»

Não resisti a tal oportunidade de te atacar com aquelas piadas desconfortáveis – olhaste para mim – foi engraçado ver a tua expressão facial a mudar radicalmente.


« Parvo » Respondeste


« Concordo, sou mesmo, mas não me leves a mal, sou mesmo assim, a chamada parvoíce natural, não tem cura »


« ok...» Respondeste e bebeste mais um copo da tua sangria, como dirias, deliciosa, ficaste calada, tal como uma criança que faz birra após saber que já não vai ter aquele brinquedo que tanto queria.


« Poderia enumerar aqui vários elogios que provavelmente já os ouviste inúmeras vezes em inúmeras circunstâncias »


« Tais como? » Interrogaste


« Tais como o teu peito bonito, as tuas pernas bem tratadas e brilhantes, ou os teus lábios claramente apetecíveis e com o brilho artificial e característico dos batons, mas isso seria tocar a mesma música para os teus ouvidos, seria ser igual a todos os outros, e quero marcar a diferença, nem que seja pela pessoa mais mal vestida aqui neste bar »


« Cala-te, estás a dar-me tanga » Disseste enquanto te rias feita perdida, que gostei, é bom alguém que se ri sem problemas, havia já qualquer coisa por onde pegar.


« Não estou nada, ou vais-me dizer que nunca te elogiaram acerca do que acabei de dizer?» Interroguei


« Já, mas não tão ao detalhe »


« Eu sou assim, gosto de detalhes, tal como os teus belos sapatos também brilhantes, esse verniz tem qualquer coisa, deve ser importado não? Humm, há qualquer coisa que me intriga nesses sapatos »


« Para!! »


« E digo-te mais, se não fosse a minha miserável roupa, o meu desgaste aparente, já te tinha convidado para um passeio romântico de barco pela ria, iríamos re-inventar hoje, o dia dos namorados »


« Lá estás tu com a mania da roupa »


« Sim, porque se eu tivesse vestido a minha melhor roupa, não ia haver um não que saísse por esses teus belos lábios, ia ser muito charme... »


« Posso ser eu agora a elogiar? » Interrogaste


« Podes...» Respondi eu de forma curiosa




« O teu charme está aí, nessas coisas malucas que dizes sem pensar » Disseste tu, de ar sério e convincente


« Ai é? Está a resultar? É que estou a dar o meu melhor... » Questionei


« É...» Respondeste como se fosses um semáforo a abrir o verde, o que me deixou num impasse, que fazer? Aparvalhar mais? Na verdade esta treta dos elogios foi além do que eu esperava, estavas ali, tão fresca, tão apetecível, tão para mim...

Decidi que, para quebrar a tensão – quase sexual – tinha que voltar a aparvalhar


« Esse “é...” significa que o passeio de barco pela ria... Vamos a isso? »


Resultou, sorriste, e quebramos ali um pouco aquela tensão, não era a tensão que era sexual, eras tu! Sim, sexual no sentido físico da palavra, no sentido que aparentavas ser dotada de conhecimentos para me fazeres atingir orgasmos plenos de loucura, que naquela hora de devaneios eras bem capaz se soltar aquela palavrinha mais ousada, ou mais porca, sei lá. Eras a minha actriz pornô dos anos 80, no bom sentido, no mais alto patamar que um dia a pornografia atingiu. Sim, foi mais um elogio.

Entretanto tinhas ido à casa de banho, e pela primeira vez – sóbrio – pude ver mais potenciais elogios para quando regressasses. Sim, o teu rabo, lindo. És pequenina, mas compacta, está tudo ali, não consegui descartar qualquer elogio ou qualidade acerca da tua personalidade, não perante tal rabo, passeavas de saia, decente, mas ao mesmo tempo descarada da forma que tão bem assentava em todos os teus mais simétricos contornos, a forma quase clara do teu fio dental era qualquer coisa, via-te a seguir em direcção à casa de banho em câmera lenta, segura, desejada, era assim que te sentias, aposto. Num abrir e fechar de olhos, foste e voltaste


« Então menino, alguma coisa se passou na minha ausência?»


« Não, acho que não... Então, já ligaste ao homem do barco?»


« Homem do barco?! »


« Sim, já te esqueceste? Do nosso passeio romântico?! »


« AH!! Sim, como poderia eu esquecer? »


« Da forma que te esqueceste... »


« Não sejas mauzinho... Mas tem que ser de barco? »


« Bem, a nado até que seria romântico, nós os dois nus a nadar, não é má ideia, mas, é que está frio, e agua gelada em nós, homens, não nos favorece. »


Sorriste com um ar que diria, malandro


« Nada, disso, não te quero ver desfavorecido, mas é que às 3h não estou a ver um barco a andar na ria... »




« Tens razão, às 3h é complicado... Sugestões? »


« Sim, vamos embora, já é tarde... » Disseste-o como que a colocar um ponto final na brincadeira


« Vamos, mas, porque cortar assim? » Interroguei


« Sim, como vais para o lado da Universidade, e eu também, dá-mos o nosso passeio a pé, junto à ria, melhor que nada não achas? »


« Concordo »


Fomos para a fila para pagar – estava enorme – era Sábado, muita gente, o bar estava cheio,


« Que seca, nunca mais vamos sair daqui » Desabafei


« Pois... »


Estávamos ali, quase encostados, e pela primeira vez senti o teu cabelo, ondulado, que cheirava a qualquer coisa, não sei o quê, mas cheirava bem


« Que espuma usas para o cabelo? » Perguntei


« Não uso »


« Ok, era só para arranjar conversa, não percebo nada dessas merdas »


Sorriste e passaste a mão pelo meu cabelo


« E tu? Que usas? » Perguntaste


« Eu? Muito pouco, nem tão pouco um pente »


« Nem laminas não é? »


« Isso foi uma boca para a minha barba? »


« Não, até gosto... Pica... »


« Assim? » E encostei o meu rosto ao teu, encolheste-te de imediato


« Pica mesmo... » Disseste tu com o teu sorriso malandro


Naquela altura, já havia contacto físico, já te metias comigo entre beliscões e piadas começávamos a estar mais próximos, fisicamente. Já passava a minha mão pelo teu rosto e este era delicioso, bem tratado.


« Posso te dar um beijo no teu queixo? » Perguntei


« No queixo? Podes, mas porquê no queixo? »


« Gostava, ou não confias em mim? »


« Confio »


Era o teste que precisava, queria ver até que ponto podia ir, que riscos podia correr.

Devagar, levei o meu rosto ao teu, olhando para ti reparei que quando estava a milímetros do teu queixo, fechaste os olhos – estavas vulnerável – e eu, cumprindo a minha promessa, beijei-te no queixo.


« Obrigado » Disse eu


« Beijo no queixo?! Não entendo, que estranho » Disseste


« Há muita coisa em mim que não ias entender » Sorri


Pagámos – finalmente – e saímos do bar, atravessámos a estrada, íamos a uma distancia correcta, de duas pessoas, que definitivamente não tinham qualquer envolvimento, confesso que o barulho dos teus saltos já me irritava, não era um barulho que eu estivesse habituado a ouvir, embora quando por momentos, passavas à minha frente e eu te via de costas o barulho dos teus saltos era o mais pequeno e insignificante pormenor. Podia – para tornar a coisa mais bonita – dizer que estava uma noite linda, com um luar maravilhoso, com flores pelas bermas das estradas, mas não, estava uma noite como as outras, normais, nem romântica nem desagradável, apenas normal. Caminhávamos junto à pseudo-Veneza, a ria de Aveiro, poderia dizer que a agua estava cristalina e os peixes estavam felizes, mas também não, estava a ria que eu conheci, quase sempre suja.


« Olho para a ria e vem-me imagens estúpidas à cabeça » Comentei


« Que imagens? »


« Nós os dois, nus, a nadar... » Disse eu com uma gargalhada


« Realmente, havia de ser engraçado. »


Parámos para fumar um cigarro, ficamos sentados – aí já mais próximos – num jardim que havia junto à berma, « que pernas », pensei eu enquanto discretamente olhava para ti, eram de facto, maravilhosas. Ficamos cerca de cinco minutos sem falar, tu olhavas fixamente e de forma quase infinita para a ria, « não entendo a beleza disto », pensei, mas respeitei e deixei-te meditar sobre todas as coisas que naquele momento passavam pela tua cabeça.


« Agora, sou eu que estou com as imagens, tu ali a nadar... » Comentaste


« … Tudo isso para veres o meu rabo? »


« Também...» Respondeste, já com a mão na minha perna, « Mas, não só, todo o teu corpo... » Reforçaste


Fiquei sem saber o que dizer, por segundos bloqueei, olhei para ti, e tu olhavas-me profundamente, com ar de gulosa, não restavam dúvidas, querias-me provar ali, junto da tal ria. Avancei para o beijo, não restavam dúvidas quanto à qualidade dos teus lábios, que tão bem se encostaram aos meus, de forma macia, lenta, o timming perfeito, lentamente roçaste na perfeição os teus lábios nos meus como se estivessem a pedir autorização, que eu de imediato cedi, na verdade cedia-te tudo ali, tudo por um beijo, foste o meu ben-u-run, por momentos perdi a noção do espaço temporal, por momentos esqueci-me que estava nesta merda de cidade que tanto odeio, e que me mantém ligada a ela para a vida. Foste tu, a minha actriz pornográfica dos tempos das pintelheiras que ali – por escassos momentos – me fizeste através, de um simples e terno beijo, esquecer de tudo aquilo, todas as voltas que a vida deu para nos fazer juntar num Sábado qualquer, junto a uma ria marcada pela sujidade das pessoas que fazem de Aveiro, uma cidade desprezável, para mim.

Dois minutos, foi o tempos que demorou para o terno passar ao ousado, e aqui, já sem qualquer tipo de autorização, enrolaste a tua língua na minha, em jogos ímpares de sedução, encostaste-te a mim fazendo questão que eu sentisse os teus belos e fartos seios, roçaste-os em mim, no meu peito enquanto as tuas mãos, exploravam o meu corpo, estavas ofegante quando paraste e disseste


« Foda-se »


« Que foi? » Perguntei


« Que beijo... »


« Mesmo, és grande!» disse eu


« Tu também, gostaste? » Perguntaste enquanto me fazias festas no rosto


« Digo-te, o meu trabalho neste beijo foi uma minoria, estiveste muito bem. » Respondi


« Sabes, porquê, que um rapaz como tu não namora? Tem haver algum problema »


« E há...»


« Há?! » Perguntaste surpreendida


« Sim, resumindo, o problema comigo é o destino »


« Destino? Como assim? »


« Eu já namorei, já fui bem feliz até, aqui nesta cidadezita... Mas as coisas não resultaram... »


« Não resultaram, fizeste merda, não? Os homens... » Censuraste


« Não fiz merda, simplesmente, não deu... »


« Ok, ainda não a esqueceste pois não? »


« Não »


« Vais ver que um dia, ainda fazem as pazes »



« Sinceramente, acho isso impossível »


« Nada é impossível, enquanto há vida há esperança »


« A questão é mesmo essa, e que não falarmos de coisas tristes? »


Falar de relacionamentos passados após um primeiro beijo entre duas pessoas, não acho que seja boa ideia. Embora não o tenhas feito por mal, embora – e confesso – tenha gostado de certa forma da preocupação e da motivação que me tentaste dar, e a forma terna que me consolaste enquanto falávamos, eu tinha que mudar de assunto, o tema estava a matar o clima. Passavas carinhosamente a tua mão pela minha barriga, e notava no teu sorriso, não digo felicidade, mas ao menos parecias contente.


« A minha barriga, não é algo que eu me orgulhe muito » Disse eu em tom de brincadeira


« Mas devias, é fofinha » Disseste tu ao mesmo tempo que me piscaste o olho


Quase impulsivamente, puxei-te para mim, e sentei-te ao colo, subi a tua saia e segurei firmemente o teu rabo


« Tens um rabo maravilhoso, sabias? »


« Ai, não fales assim comigo, cuidado » Disseste em tom novamente ofegante


« Porquê? » Perguntei, enquanto já tinha alcançado o seu fio dental que teimosamente não saia entre as tuas belas nádegas


« Continua e eu como-te aqui » Arrebataste


« Parece-me tentador, mas vai ter que ficar para outra altura »


« Porquê?! Estás com o período?! » Disseste, e que bem te saiu, não esperava uma piada assim


« Estiveste muito bem agora »


« Vamos até casa, é melhor? »


« Acho que sim, cada um vai dormir, e amanha é outro dia » Respondi


« Diz-me uma coisa, sinceramente, não gostaste? »


« Sinceramente, gostei, muito até, mas acontece que não tenho precaução, nem aqui, nem em casa, e sem isso... não vale a pena. »


« Sim, claro. Vai ter que ficar para a próxima, se houver. »


« Claro que vai, como tu disseste e bem, enquanto há vida, há esperança. »



Seguimos os dois pela madrugada até casa, até a minha cama onde – confesso – pensei em ti, não queria que fosses mais uma na minha vida, mas vais acabar por o ser, porque, nós não fomos feitos um para o outro, teríamos feito amor, teríamos até apenas passado a noite naquele banco de jardim a falar das coisas mais ridículas e insignificantes, porque seria a prova que para além do teu rabo maravilhoso, eu teria prazer em pura e simplesmente falar contigo, de estar contigo, de saber o que fazias quando tinhas oito anos, como se chamava o teu cão ou gato nessa altura, o que gostavas de fazer nas férias grandes, se tens a comunhão e o crisma. Todas essas coisas, não te perguntei porque simplesmente nem me lembrei, nem tu te lembraste, porque, essas coisas só interessam a quem pensam em nós como projecto de vida, algo a longo prazo, a tudo isto podemos chamar de amor, ou algo semelhante. Por outro lado, arranjar pontos em comum de forma forçada, responder o típico eu também, dizer que tens uns lábios bonitos, umas pernas bonitas, um peito bonito, que te vestes bem, que cheiras bem, que tens tanta piada, etc... Fazer-mos alguém fazer sentir-se roçada pela perfeição fisicamente falando, a isso chama-se tesão, ou algo semelhante. E a pergunta que anda agora na tua cabecinha é: Será que isso faz de nós más pessoas? Não! Apenas humanos.

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